Vivia a ostra bela e ajuizadamente numa rocha. Não sonhava com o amor, mas quando fazia bom tempo ficava boquiaberta, na maior beatitude possível. Encontrou-a porém o arenque, e foi uma paixão à primeira vista. Ficou perdidamente enamorado sem se atrever a confessar-lho. Ora num dia de Verão a ostra bocejava feliz e queda. Encolhido atrás de um rochedo o arenque contemplava-a mas, de súbito, beijar a bem amada foi um desejo tão forte que nem pôde refreá-lo. Meteu-se então entre as placas abertas da ostra e esta, surpreendida, fechou-as decapitandoo o miserável que flutuou à deriva e sem cabeça, pelo oceano... Guillaume Apolinaire, "O Poeta Assassinado", tradução de Aníbal Fernandes, Estampa, 1983
1 comentário:
Prefiro ver na ostra (ou na pérola, vá...) a ironia e a trancendência da vida vivida por olhares humanos.
A pérola não é mais que uma aberração da natureza... uma imperfeição... um grão de poeira que penetrou no interior da ostra e que esta vai envolvendo numa substância que dá origem à pérola.
É a imperfeição que torna valiosa a ostra... é a imperfeição que gera a magia e encanta os olhos humanos.
No entanto, passamos a vida há procura da perfeição...
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